Como o hummus ajuda a entender o Oriente Médio?
Há uma disputa sobre a origem do hummus do falafel, do quibe e de outros pratos que, no Brasil, associamos aos libaneses. Afinal, no caso do hummus e do falafel, também são vistos em outras partes do mundo como pratos israelenses e palestinos. E alguns dizem ter comido na Turquia. Outros lembram que o iogurte grego também existe na Síria (labne ou coalhada) e em muitos outros países, especialmente a Turquia.
Na verdade, esta disputa é uma bobagem porque o hummus, o falafel, o quibe o tabouli e tantas outras comidas são muito mais antigos do que o Líbano, Israel, Síria, Chipre, Grécia (se levarmos em conta o país atual) e todos os demais países da região, incluindo o atual Estado egípcio, que não é o mesmo da época dos faraós.
Estas comidas foram criadas na região do Mediterrâneo oriental. Em lugares onde hoje estão estas nações que integraram diferentes impérios ao longo da história, incluindo o Romano e o Bizantino, e, mais recentemente, o Otomano. Mais uma vez, e gosto de insistir nisso, era uma faixa que se iniciava em Alexandria (Egito) e terminava em Salonika (Grécia) e ficou conhecida como Levante.
Embora Israel hoje seja o país dos judeus, havia mais judeus na época vivendo espalhados por toda a região. Já escrevi hoje e volto a escrever algo que acho surpreendente para muitas pessoas – judeus, no início do século 20, eram a maior pluralidade de Bagdá e de Salonika, ambas cidades então governadas pelo Império Otomano. Havia também muitos judeus em Beirute, Damasco e Aleppo, onde o hummus, o falafel e o quibe eram e são muito populares. E muitos deles, assim como os que viviam na região da Palestina, introduziram estes pratos em Israel, hoje também consumidos por judeus de origem europeia.
Portanto não existe esta questão de quem criou estes pratos. São pratos que, genericamente, podem ser classificados como otomanos e hoje existem ao redor do mundo, incluindo no Brasil e nos EUA. Genericamente, podem ser chamados de sírio-libanês, otomano. Árabe? Sim, embora sejam muito mais relacionados com os países do Mediterrâneo, sejam eles árabes, como Síria e Líbano, ou não, como Israel e Turquia. Os sauditas possuem uma culinária completamente distinta.
E esta culinária independe da religião. Cristãos, muçulmanos (sunitas e xiitas), judeus e drusos comem hummus. Aliás, qualquer ser humano com um mínimo de paladar come hummus. E isso serve para mostrar que, ao receber refugiados sírios, não pergunte porque eles não foram para a Arábia Saudita (muitos foram) que teria uma cultura mais próxima da deles. Não tem. Os sírios são um povo totalmente integrado à cultura mediterrânea oriental, que influenciou também a cultura brasileira.
Resumindo, onde se come a melhor comida “otomana”? Eu diria que na Síria e no Líbano, mas sou enviesado e minha opinião deve ser vista com enorme cautela.
GUSTAVO CHACRA