Morre advogada há 238 dias em greve de fome para exigir julgamento justo
A morte de uma advogada em greve de fome num hospital de Istambul está a provocar uma onda de indignação entre políticos, ativistas, artistas e jornalistas turcos.
Ebru Timtik, presa desde Setembro de 2018 e condenada em Março do ano passado a mais de 13 anos de prisão por pertencer a uma “organização terrorista”, teria em breve o seu caso revisto pelo Supremo Tribunal da Turquia. Morreu um dia depois de várias organizações avisarem que a sua vida estava “por horas, não dias”.
A advogada curda estava desde Janeiro sem ingerir alimentos, o protesto possível junto das autoridades para “reforçar a exigência de um julgamento justo”, num país onde se acumulam queixas de violações dos direitos humanos. Em Fevereiro, juntou-se à greve de fome Aytaç Ünsal, seu colega na Sociedade Progressista de Advogados (ÇHD)
No final de Julho, um relatório forense concluíra que “não estavam em condições de permanecer na prisão” – em vez de serem libertados, foram enviados para dois hospitais onde a saúde de ambos se tinha vindo a deteriorar. Çigdem Akbulut, secretária da ÇHD em Istambul, disse a semana passada à BBC Turca que as condições nos hospitais eram piores do que na prisão: “As suas necessidades, água, limão, vitaminas, chá – é isto que eles consomem – são supridas tarde ou não são de todo”, descreveu.
Numa declaração divulgada a 11 de Agosto pela Associação Internacional de Advogados, os dois diziam tencionar “persistir na greve de fome mesmo se isso levar à morte”. Nesse comunicado, os presidentes de 33 ordens de advogados repetiam a exigência de libertação dos dois, sustentando que “não são só as vidas de Ebru e Aytaç que estão em risco, mas o seu direito a uma defesa”.
Semanas antes fora Selahattin Demirtas, ex-co-presidente do HDP (Partido Democrático do Povo, pró-curdo), a apelar a uma solução: “Independentemente de considerações políticas, por favor não deixem a humanidade morrer, por favor resolvam o assunto, ‘deixem-nos viver”.
“O Tribunal Constitucional rejeitou a libertação dela porque ‘não havia risco de morte’”, recordou Gürsel Tekin, deputado do Partido Republicano do Povo (CHP), na oposição, horas depois de confirmada a morte de Timtik, na quinta-feira. “Um sistema de justiça politizado significa uma justiça transformada em carrasco”, diz Tekin, responsabilizando o AKP (Partido da Justiça e do Desenvolvimento), do Presidente Recep Tayyip Erdogan, por esta morte. “A história e a nação irão julgar o regime do AKP pelos crimes que cometeu contra a justiça.”
Humanidade e consciência
“A morte de Ebru é, aos olhos de todos, a morte da humanidade, da justiça e da consciência neste país”, reagiu Zülfü Livaneli, músico, escritor e político. O jornalista e sindicalista Ahmet Sik tem a certeza de que “este mal terá um fim, mas por causa do silêncio de hoje quando esse dia chegar os turcos não vão conseguir olhar-se nos olhos”.
O processo de Timtik e de Ünsal envolveu 18 advogados condenados por crimes “relacionados com terrorismo” a um total de 159 anos de prisão. Timtik foi condenada a partir de um testemunho anônimo que veio a pedir que as suas declarações não fossem consideradas “por causa do seu estado mental”, escreve a agência de notícias independente de Istambul Bianet.
“Lutamos por justiça. E se formos libertados vamos poder continuar o nosso trabalho em nome da justiça”, escreveu Timtik numa carta enviada a 18 de Julho através da sua tia. “Não podemos fazer nada a não ser a greve de fome. Temos as mãos atadas. É isso que custa mais.”