A Turquia de Erdogan está atrás de armas nucleares ?
Considerando o fato que a Turquia, sob o Presidente Recep Tayyip Erdogan, tem emulado o modelo iraniano por algum tempo, de investir em grupos de procuração para alavancagem e mudança de regime, a exportar a ideologia islamista do partido governante para além das fronteiras, não se deve ficar surpreso em descobrir que um programa clandestino para adquirir armas de destruição em massa (ADMs), incluindo um dispositivos nucleares para dissuasão, esteja de fato em andamento.
Se é alguma indicação, a campanha deliberada para avançar com a questão para a aceitação geral na sociedade turca, feita por pessoas chaves próximas a Erdogan, deve ser perturbadora para observadores da Turquia, que passaram a ficar bem inquietos quanto à direção futura deste país aliado da OTAN estrategicamente localizado. Hayrettin Karaman, o principal emissor de fátuas (edito religioso) do presidente turco, forneceu não apenas sua bênção para que o governo adquira ADMs, mas também encorajou a liderança turca a fazer o mesmo. Karaman, considerado como sendo o equivalente turco do imã Yousef Qardawi — o clérigo e líder espiritual egípcio da Irmandade Muçulmana que aprova atentados suicidas e a rebelião armada na Síria — e uma figura proeminente entre islamistas turcos, escreveu no jornal Yeni Safak em 16 de março de 2017 que “precisamos considerar produzir essas armas [ADMs] ao invés de comprá-las sem perder tempo algum e sem consideração a palavras [de cuidado] e obstáculos do Ocidente.”
Erdogan procurou com frequência a ajuda desse clérigo quando queria promover uma questão para discussão pública, fornecendo uma legitimidade religiosa para o que planeja fazer. Aliás, Karaman emitiu opiniões religiosas justificando uma repressão sem precedentes que o governo lançou contra a Movimento Gulen e outros grupos críticos e de oposição. Ele declarou os turcos que votaram contra Erdogan como sendo não-islâmicos. Karaman estava entre os primeiros críticos dos esforços em prol do diálogo interconfessional defendido pelo erudito muçulmano turco Fethullah Gulen, e Erdogan acabou desabafando que era da mesma opinião, em 17 de novembro de 2016, durante uma visita ao Paquistão, quando disse que um diálogo interconfessional entre o Islã e a Cristandade era impossível e descartou um diálogo com o Vaticano.
Portanto, seja o que for que Karaman diga não pode ser jogado de lado sem se considerar quanto peso carrega nos olhos dos governantes islamistas da Turquia. Sua narrativa frequentemente resultou em medidas políticas do governo de Erdogan, e não se pode arriscar com a alarmante proposta de ADMs que ofereceu. “Vamos inventar [essas ADMs] e balancear [o poder do Ocidente],” escreveu ele, enfatizando que a Turquia tem que adquirir armas letais que sejam mais poderosas ou iguais as do inimigo, que é o Ocidente e o mundo não-muçulmano.
A segunda indicação de que líderes turcos possam estar tramando algo com ADMs veio de um jornalista islamista de grande importância que frequentemente acompanhava o presidente turco durante visitas de estado e viajava com ele no avião presidencial. Ibrahim Karagul, o editor-chefe do Yeni Safak, um jornaleco porta-voz para Erdogan, escreveu em 27 de março de 2017, 11 dias depois que Karaman expressou sua opinião, que a Turquia deveria tomar medidas extraordinárias, incluindo adquirir capacidade de armas nucleares contra os Cruzados Ocidentais, que estão travando guerra contra a Turquia. Ele defendeu a opinião de que a Turquia deva mobilizar todas as comunidades e países muçulmanos que possa alistar como aliados e montar uma resistência a esse massacre dos poderes ocidentais.
Na verdade, quando Sahin Alpay, um autor veterano de professor de ciências políticas, escreveu no jornal Zaman em 14 de abril de 2015 que o governo de Erdogan estava atrás de tecnologia nuclear para adquirir armas sob o disfarce de obter pacíficos reatores de energia nuclear, foi Karagul que reagiu a isso primeiro. O governo não ficou contente com o razoável de Alpay que a tecnologia de energia nuclear poderia criar uma dor de cabeça para a Turquia no futuro. Um ano depois que seu artigo apareceu no jornal, o Zaman, o jornal de maior circulação na Turquia, foi confiscado ilegalmente pelo governo de Erdogan. Este bem respeitado homem de 73 anos foi preso em julho de 2016 e tem estado na cadeia por um ano sob acusações falsas de tramar um golpe, um crime que consistentemente se opôs por toda sua carreira. O gabinete de Erdogan também mobilizou seu exército de milhares de trolls no Twitter para criticá-lo enquanto defendiam a aquisição de tecnologia de armas nucleares.
A campanha que apoia a aquisição de armas nucleares ainda está correndo entre os partidários de Erdogan. Escrevendo no jornal Milat, que é pró-Erdogan, o colunista Galip Ilhaner afirmou em 25 de julho de 2017 que a Turquia deveria adquirir armas nucleares em cooperação com o Paquistão. Ele postou uma mensagem em sua conta no Twitter em 30 de julho dizendo que a real razão para a expulsão do primeiro-ministro do Paquistão, Nawaz Sharif, por causa da riqueza inexplicada de sua família era para impedir o Paquistão de transferir armas nucleares para a Turquia. Sabri Isbilen, um escritor do jornal islamista Dirilis Postasi que possui seguidores no governante Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), que escreveu em 27 de outubro de 2016 que o Paquistão, Turquia e Catar têm trabalhado em capacidades de melhoramento de armas conjuntas, incluindo nuclear. Conspirações como essa podem soar inverossímeis e difíceis de provar; no entanto, existem dezenas de propagandistas do governo articulando essas narrativas em plataformas públicas. Infelizmente, certamente existe um crescente circulo eleitoral na Turquia que está pronto para acreditar nessas histórias.
Não sou nenhum perito nos aspectos técnicos da tecnologia nuclear e sei pouco sobre tecnologia nuclear civil e militar. Tem havido argumentos de ambos os lados defendendo opiniões opostas quando o assunto são as reais ambições da Turquia. Uma posição defendida por Hans Ruhle, antigo chefe da equipe de planejamento no Ministério da Defesa alemão, em um artigo na National Interest em 22 de setembro de 2015, foi de que a Turquia está se posicionando similarmente ao Irã em seu potencialização da energia nuclear civil para uma capacidade para armas nucleares em potencial. O artigo criou muito barulho e elicitou uma resposta do governo turco que o rejeitou como difamação. Outros como Philip Baxter, um associado de pesquisa sênior do James Martin Center for Nonproliferation Studies (Centro Justin Martin para Estudos de Não-proliferação), desafiaram os argumentos de Ruhle em vários pontos, alguns técnicos, que não possuo qualificações para questionar, mas pareceram convincentes.
Mas uma asserção que foi feita por Baxter em uma base de segurança pede por ainda mais questionamentos. Ele disse: “O panorama de segurança externa e estrutura de aliança são também dramaticamente diferentes do que os do Irã,” enfatizando que “a Turquia é um membro de longa data da aliança da OTAN. A garantia de segurança do Artigo V assegura a segurança existencial da Turquia.” Bem, isso teria sido verdade há dois anos, mas hoje o governo de Erdogan considera os EUA e outros aliados da OTAN como sendo nações hostis, mina as batalhas da coalizão anti-ISIL liderada pelos EUA no norte da Síria, bloqueia a cooperação da OTAN com parceiros tais como a Áustria e forçou tropas alemãs a se retirarem de bases turcas depois de ter fornecido acesso apenas alguns anos atrás. A Turquia está se tornando cada vez mais um aliado imprevisível e menos confiável. O próprio Erdogan tem se mantido ocupado intimidando, criticando e atacando aliados da OTAN em discursos públicos, alimentando um frenesi anti-EUA e anti-OTAN na nação predominantemente muçulmana com 80 milhões de cidadãos.
E ainda mais, a Turquia não está realmente comunicativa com os detalhes dos negócios que fechou com a Rússia e Japão para construir duas usinas nucleares na Turquia e fornece pouca clareza quanto ao que realmente espera realizar. As perguntas dos legisladores da oposição no Parlamento quanto a esses negócios ou não foram respondidas, em violação de estatutos parlamentares, ou receberam uma resposta que carecia de substância. Aytug Atici, legislador do oposicionista Partido Popular Republicano (CHP), que fez várias perguntas ao ministro das energias a respeito dos negócios para se construir usinas de energia nuclear, acredita que o governo de Erdogan realmente esteja indo atrás de tecnologia de armas. Hayrettin Kilic, um físico nuclear radicado nos EUA que se opôs ao governo turco construir usinas nucleares, também disse que acredita que o real objetivo da Turquia seja manufaturar armas nucleares em vez de produzir eletricidade.
Seja qual for a real motivação que impulsiona Erdogan a construir não duas mas três usinas nucleares com transferências de tecnologia e capacidades de manufatura locais, existem bases razoáveis para se ficar desconfiado com o comportamento do governo turco sob a liderança de Erdogan. O fato de que ele introduziu seu genro Berat Albayrak para ficar encarregado desses acordos nucleares sugere que Erdogan esteja propenso a manter os detalhes dessas negociações bem próximas ao fazer com que os membros de sua família supervisionem as negociações.
A Turquia não mais é o mesmo país que costumávamos conhecer, e muito mudou desde que Erdogan consolidou sua base de poder e começou a desmantelar instituições democráticas. Ele construiu uma ditadura islamista onde o estado de direito não mais se aplica, direitos e liberdades fundamentais são violados em uma larga escala e princípios democráticos tais como separação de poderes, responsabilização e pesos e contrapesos não mais são respeitados. A Turquia como conhecemos nunca se aventurou em mudança de regimes antes de a crise na Síria ter se iniciado em 2011, ou armou e financiou jihadistas para desestabilizar países vizinhos e nunca se engajou em exportar uma ideologia islamista política para outros países, incluindo a Europa e a América do Norte. Talvez uma mudança que nunca pensávamos possível em adquirir armas nucleares face aos fortes comprometimentos da Turquia com tratados internacionais pode também estar a caminho. Seria esperto ser precavido do que se arrepender depois ao se levar a Turquia de Erdogan a um exame mais de perto.
Por Abdullah Bozkurt
Fonte: www.turkishminute.com