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Mistérios, e uma repressão, persistem um ano após a tentativa fracassada de golpe na Turquia

Mistérios, e uma repressão, persistem um ano após a tentativa fracassada de golpe na Turquia
julho 27
16:53 2017

O golpe fracassado na Turquia, que se desdobrou há um ano no dia 15 de julho de 2016, teve um impacto profundo na vida turca contemporânea. Longe de acabar com o regime do Presidente Recep Tayyip Erdogan, o golpe apertou o controle dele no país, dando-lhe o espaço político para impôr um estado de emergência que ainda está em vigor, demitir ou suspender cerca de 150.000 dissidentes e os acusados de serem golpistas, e prender aproximadamente 50.000 pessoas.

Mas, enquanto que as consequências do golpe estão claras, ainda há perguntas sobre o que aconteceu durante o golpe.

Quem esteve envolvido?

O governo turco diz que a tentativa de golpe, que deixou mais de 240 pessoas mortas, foi liderado por Fethullah Gulen, um clérigo islâmico e antigo aliado do Sr. Erdogan, que vive em exílio nos Estados Unidos. Os seguidores do Sr. Gulen têm ingressado nas instituições estatais turcas por várias décadas.

Existe uma grande quantidade de evidências circunstanciais de que os gulenistas tiveram um dedo no golpe. Por exemplo, dois gulenistas civis – Adil Oksuz e Kemal Batmaz – foram presos nas vizinhanças da base aérea que serviu como o quartel-general do golpe. Hulusi Akar, o chefe lealista do exército que foi detido pelos golpistas, disse depois em um testemunho por escrito que um general com ligações ao golpe lhe ofereceu a chance de falar com o Sr. Gulen por telefone. O ajudante de ordens do Sr. Akar, que ajudou a deter o Sr. Akar na noite do golpe, admitiu em um testemunho por escrito ser um gulenista, apesar de que esse testemunho foi dado sob coerção.

Mas não está claro se os gulenistas agiram por conta própria. Alguns dos acusados serem gulenistas admitiram terem participado na tentativa de golpe enquanto negavam quaisquer ligações com o Sr. Gulen. Na noite do golpe, alguns generais levaram mais de três horas para declarar publicamente apoio ao Sr. Erdogan, suscitando rumores de que alguns deles podem ter apoiado o golpe inicialmente, apenas para mudar de ideia quando o golpe parceria estar falhando.

A agência de inteligência da União Europeia desde então declarou que acredita que entre os golpistas estavam inclusos vários secularistas e oportunistas tanto quanto gulenistas. Funcionários da agência e da inteligência alemã dizem que não acreditam que o Sr. Gulen ordenou pessoalmente o golpe.

Quem sabia o que, e quando?

O indiciamento contra os golpistas sugere que os funcionários da inteligência turca foram avisados sobre a insurreição pelo menos seis horas antes de ela ter começado na noite de sexta-feira, 15 de julho. Um major que foi mencionado no indiciamento apenas pelas iniciais “O.K.” foi designado pelos líderes do golpe para ajudar sequestrar o chefe da inteligência turca, Hakan Fidan. Mas O.K. em vez disso relatou o plano de sequestro ao escritório do Sr. Fidan por volta das 3:30 p.m. na sexta-feira, e o escritório do Sr. Fidan então informou o Sr. Akar. Na declaração por escrito do major, ele diz que deu um aviso claro de que o sequestro poderia ser parte de uma tentativa de derrubar o governo.

Como resultado, alguns analistas acham a reposta subsequente do Sr. Fidan e do Sr. Akar estranhamente lenta e fragmentada. Em declarações por escrito ao Parlamento, o Sr. Fidan disse que não ligou para o gabinete do presidente até as 7:26 p.m., e mesmo então não falou com o presidente ou explicou aos subordinados do Sr. Erdogan exatamente o que estava acontecendo. Mais tarde naquela noite, disse o Sr. Fidan, ele se reuniu com um líder da oposição síria, como se não houvesse nada com que se preocupar.

O Sr. Akar disse que não ordenou aproibição de decolagem da força aérea turca até por volta das 6:30 p.m., e que ordenou confinamentos em apenas certas bases do exército. Ele também levantou suspeitas ao levar vários meses para fornecer um testemunho por escrito para uma investigação parlamentar sobre o golpe – um testemunho que acabou suscitando tantas perguntas quanto respostas.

As próprias declarações do Sr. Erdogan também levantaram perguntas sobre a sequência de eventos. Em um relato postado no site do presidente, o Sr. Erdogan disse que ele foi avisado inicialmente de atividades militares incomuns às 4:30 p.m. por seu cunhado. Ele tentou contatar o Sr. Fidan e o Sr.Akar por volta das 5 p.m., disse ele, mas que não conseguiu falar com nenhum deles.

A confusão sobre o que aconteceu nas horam que levaram até o golpe em julho passado levou a especulações entre a oposição turca de que o governo pode ter permitido que o golpe se desdobrasse, ou até o encorajou, para justificar a repressão subsequente. O líder do maior partido de oposição da Turquia, Kemal Kilicdaroglu, descreveu o que aconteceu como um “golpe controlado”.

Porque o golpe foi tão mal executado?

No início do golpe, soldados rebeldes começaram a bloquear ruas e pontes por volta das 10:30 p.m. em uma noite de sexta-feira – uma hora quando a maioria dos turcos ainda estava acordada e por aí, e portanto um momento estranho para começar uma operação que dependia da surpresa. Alguns observadores sugeriram que o golpe deveria ter começado muito mais tarde na noite, mas que foi apressado depois que os líderes do golpe perceberam que seus planos haviam sido descobertos.

Outras decisões são mais difíceis de se explicar. Os golpistas invadiram a emissora estatal, TRT, no começo da noite mas não fizeram nada com a maioria dos canais de televisão privados do país. Esses canais colocaram autoridades do governo no ar por toda a noite, deixando o governo controlar a narrativa. E enquanto que os golpistas tentaram capturar o Sr. Erdogan, poucas tentativas parecem ter sido feitas para capturar outras figuras importantes do governo.

A tentativa de sequestrar o Sr. Erdogan foi estragada. Os soldados enviados para o capturar não chegaram ao seu hotel de férias até várias horas depois que o golpe começou. Em uma audiência recente no tribunal, um deles, o Brigadeiro General Gokhan Sonmezates, disse que haviam sido ordenados a esperar, uma decisão que ele achou estranha. “Quem nos enganou”, perguntou o General Sonmezates, “e nos fez esperar por quatro horas?”

O que os potências estrangeiras sabiam?

Na Turquia, a resposta dos governos estrangeiros aos eventos que se desdobravam foram vistas como lentas e hesitantes, suscitando os apoiadores do Sr. Erdogan a sugerir que o golpe tivera o apoio tácito, ou ao menos aconteceu com o presciência dos aliados da Turquia, incluindo os Estados Unidos. Nenhuma evidência disse veio à tona, mas o fato de que o Sr. Gulen vive em solo americano alimentou especulações de que as autoridades estrangeiras devem ter recebido um aviso.

Declarações feitas por Michael T. Flynn, o general americano reformado que mais tarde serviu brevemente como o primeiro conselheiro de segurança nacional, parece fortalecer essa impressão. Falando conforme o golpe se desenrolava, o Sr. Flynn sugeriu que ele havia sido informado da operação por um amigo nas forças armadas turcas, e expressou seu apoio. (Ele mais tarde reverteu sua posição e culpou o Sr. Gulen pelo golpe, jogando algumas dúvidas sobre quanto o Sr. Flynn soubera na época.)

Segundo um relato, o governo russo sabia dos planos de golpe e avisou o governo turco. Um representante do prefeito de Ancara contou ao Hurriyet, um importante jornal turco, que Aleksandr Dugin, um acadêmico russo com laços com o Kremlin, alertou os legisladores e oficiais de inteligência turcos sobre atividades militares incomuns antes de o golpe começar.

Onde está Adil Oksuz?

Adil Oksuz, um professor de teologia, foi um dos dois gulenistas civis presos perto da base aérea na manhã depois que o golpe começou. Ele é acusado de liderar a operação.

Dois dias depois de sua prisão, ele foi solto sob a ordem de um juiz que desde então reconheceu ser um dos gulenistas. Uma vez livre, o Sr. Oksuz desapareceu, e seu paradeiro está sujeito a uma ampla especulação.

Veículos de mídia pró-governo insinuam que os Estados Unidos está escondendo o Sr. Oksuz e apontam para relatos que dizem que funcionários consulares americanos haviam tentado o contatar em 21 de julho, seis dias depois que o golpe começou. A Embaixada dos Estados Unidos na Turquia disse que estava simplesmente tentando o notificar que seu visto para viajar para os Estados Unidos havia sido revogado sob o pedido do governo turco.

Por Patrick Kingsley

Fonte: https://www.nytimes.com/

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