Cúpula Mundial Humanitária quer um futuro melhor
Na abertura da Cúpula Mundial Humanitária em Istambul nesta segunda-feira (23), o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, uniu-se ao presidente turco, a ativistas e celebridades internacionais para pedir que a comunidade global crie um futuro diferente para o mundo.
“Estamos aqui porque uma ação humanitária global está mais tensa do que nunca”, disse a milhares de participantes na cerimônia de abertura, que teve performances criativas e palavras inspiradoras de celebridades como Forest Whitaker, Ashley Judd e Daniel Craig.
“Propus essa cúpula quatro anos atrás por preocupação com as crescentes necessidades humanitárias e com a vontade política declinante. Hoje, a urgência só cresceu”, disse o secretário-geral das Nações Unidas.
Como parte de um espetáculo que simulou tempestades de areia e terremotos, a cantora do Mali Inna Modja encarregou-se da abertura da cúpula com um poema emocionante.
As Nações Unidas estimam que um número recorde de 130 milhões de pessoas precisam atualmente de ajuda humanitária, sendo que o número de deslocados hoje é o maior desde o fim da Segunda Guerra Mundial.
“Esta é uma reunião da ONU do século 21”, disse Ban, acrescentando que sua Agenda para a Humanidade, documento que publicou recentemente para guiar as discussões e ações do encontro, é baseada em consultas feitas por três anos com 23 mil pessoas em mais de 150 países.
Nos próximos dois dias, a cúpula reunirá atores que têm interesse em melhorar o sistema humanitário global, incluindo mais de 65 chefes de Estado e de governo, assim como líderes dos setores público e privado.
O chefe da ONU enfatizou que o encontro busca comprometimentos sobre cinco principais responsabilidades: evitar e encerrar conflitos; respeitar as leis da guerra; não deixar ninguém para trás; trabalhar de diferentes formas para acabar com as necessidades humanitárias; investir na humanidade.
“Estamos aqui para desenhar um futuro diferente”, disse Ban. “Hoje, nós declaramos: somos uma só humanidade, com responsabilidade compartilhada”.
Paralelamente, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, expressou esperança de que a cúpula leve a “resultados auspiciosos” para centenas de milhões de pessoas que enfrentam dificuldades para manter suas vidas sob fortes tensões.
“A dor não diferencia cor, raça, língua ou religião”, disse Erdogan, completando que é com isso em mente que a Turquia realizou assistência e projetos de desenvolvimento em mais de 140 países no mundo todo, recebendo mais de 3 milhões de refugiados da Síria e do Iraque.
“Nunca fecharemos nossas portas ou nossas fronteiras para as pessoas”, declarou. “Nós, como líderes e indivíduos responsáveis pela comunidade internacional só poderemos ter sucesso se trabalharmos sob princípios e objetivos comuns”, disse.
O presidente também enfatizou que a Turquia continuará perseguindo “ditadores que derramam sangue” e irá garantir que crimes contra a humanidade não fiquem impunes.
Antes dessas declarações, sobreviventes de catástrofes humanitárias — tanto causadas pelo homem como desastres naturais — fizeram discursos emocionantes à plateia, detalhando suas experiências e como as superaram com o objetivo de apoiar outros.
Victor Ochen, ex-soldado do norte de Uganda, falou sobre como foi crescer com a violência em todos os lugares. Aos 13, ele escolheu um caminho diferente, ao criar um clube pela paz em seu campo de refugiados para desencorajar crianças e jovens a se unir às forças armadas. “A paz vem de dentro”, disse. “Seja humano e aja como um humano”.
Victoria Arnaiz-Lanting descreveu a experiência de ter passado por um tufão que atingiu as Filipinas em 2013, dizendo que foi um milagre ter sobrevivido. Ela perdeu muitos amigos e colegas na tempestade, e disse que cadáveres ocupavam as ruas. O tufão também deixou milhares de deslocados internos que, diante da fome, saquearam supermercados.
Mesmo assim, ela disse ter sido inacreditável ver pessoas reconstruindo suas vidas. A Cruz Vermelha nas Filipinas e as próprias vítimas começaram a tratar os feridos e se conectar com o governo e outros atores humanitários.
“Isso é a humanidade em ação”, disse, completando que os desastres afetam mais de 200 milhões de pessoas por ano e que o preparo contra eles deve ser cotidiano. Ela encorajou todos os países, grandes e pequenos, a apostar nos atores locais.
Falando sobre o conflito sírio, Adeeb Ateeq disse que a guerra provocou muito sofrimento na população. Minas atingiram homens, mulheres e crianças, sendo que muitos ficam com medo de buscar assistência médica por temer encontrar mais artilharia pelo caminho.
“Decidi aproveitar minha experiência com a desativação de minas para combater a perda de vidas”, disse, descrevendo uma equipe de voluntários que ele criou para informar jovens sobre as minas terrestres.
Lembrando sua própria experiência de ter perdido uma perda após pisar em uma mina, Ateeq disse que teve de usar cadeira de rodas até conseguir um membro artificial, o que permitiu que ele começasse a tentar ajudar os demais.
“Meu objetivo é salvar vidas de civis inocentes”, disse, pedindo que todos forneçam assistência nesse tema e apelando por assistência na busca pela salvaguarda da humanidade.
Especialistas da ONU pedem comprometimento dos Estados
O objetivo da Cúpula Mundial Humanitária é estabelecer compromissos para fortalecer o sistema humanitário mundial no que se refere ao preparo e à resiliência, com foco nas respostas locais, disse na quinta-feira (19) o coordenador humanitário das Nações Unidas, Stephen O’Brien.
“Essa cúpula é uma forma de dizer, vamos nos unir, vamos entender como podemos trabalhar melhor, vamos estabelecer compromissos para o futuro”, disse O’Brien. “Com tantos chefes de governo, de Estado, a cúpula impulsionará nossa agenda para os próximos anos”, disse, enfatizando a importância de vontade política no encontro.
Também na quinta-feira, a relatora especial da ONU para os direitos das pessoas com deficiência, Catalina Devandas-Aguilar, pediu que todos os países levem em consideração as necessidades das pessoas com deficiência em suas respostas humanitárias.
“A cúpula representa uma oportunidade única para impulsionar o apoio à inclusão de pessoas com deficiência em todos os aspectos da ação humanitária”, disse.
Os desafios das ações humanitárias são ainda maiores para as pessoas com deficiência devido às barreiras físicas. A ausência de políticas de inclusão de pessoas com deficiência nas ações humanitárias contribui para essa exclusão, devido ao acesso desigual a serviços de emergência, segundo a especialista.