Movimento Gülen: representar muçulmanos e o Islã positivamente
Muitos dos problemas globais de hoje, especialmente os relacionados à política, são associados aos muçulmanos ou ao Islã. Os incidentes do 11 de Setembro, juntamente com outros atos de terrorismo, nutriram ainda mais o sentimento de ódio ao Islã e seus seguidores. Tais imagens negativas, especialmente na forma como são retratadas pela mídia ocidental, cultivaram sentimentos desagradáveis no público em geral. Esforços para remediar esses sentimentos, contudo, não foram bem-sucedidos em reduzir o ódio e animosidade entre alguns grupos. Apesar de tentativas de explicar que aquelas ações negativas [atos terroristas] são não-islâmicas, seria difícil mudar a percepção do público se este não for provido com imagens mais convincentes que ajudem a construir pontes para uma coexistência pacífica. Um dos grupos que defendem diálogos entre comunidades e religiões, tolerância e aceitação é o Movimento Gülen.
A personalidade por trás do Movimento Gülen é um indivíduo chamado Fethullah Gülen, ex-imã do Estado turco que se tornou o intelectual islâmico mais famoso da Turquia. Como intelectual religioso e ativista da paz, Gülen influenciou uma geração inteira de muçulmanos ao redor do globo e os inspirou a ter um papel importante em diálogo e projetos educacionais no mundo todo. Em grande parte, seus escritos motiva as pessoas a porem sua filosofia em prática: as ideias não permanecem no campo da teoria e inspiração, mas se tornam um plano de ação implementado pelos membros do Movimento.
Douglas Frantz do New York Times disse que apesar de ser pouco conhecido nos Estados Unidos, por muitos anos, Gülen foi um embaixador não oficial da Turquia que promovia uma versão moderada do Islã. Ele pregou tolerância ao se encontrar com o Papa João Paulo II e outros líderes religiosos e políticos, entre eles primeiros-ministros e presidentes turcos. A mensagem de Gülen é bem recebida no Ocidente, em parte, porque a mensagem de outros grupos muçulmanos, com frequência, não é clara.
Gülen é uma personalidade impressionante, com ideias aceitas pelas massas. Além de fazer apresentações e discursos, Gülen é um escritor prolífico que já escreveu mais de 60 livros relacionados ao Islã. Em trabalho intitulado “What Made the Gülen Movement Possibel” (O que fez o Movimento Gülen Possível), Mustafa Akyol descreve Fethullah Gülen como a pessoa que teve uma visão que o levaria e a seus seguidores a um ponto onde nenhuma outra comunidade muçulmana teria sonhado.
Como intelectual religioso e ativista da paz, Gülen influenciou uma geração inteira de muçulmanos ao redor do mundo a tomarem parte em projetos e fundações educacionais e de caridade. Ao mesmo tempo, Gülen foi capaz de criar uma relação positiva entre o Ocidente e o mundo muçulmano pela simples razão de que sempre teve o objetivo de mostrar a missão universal do Islã, que é servir às pessoas independentemente de religião, cor ou nacionalidade. De acordo com a revista The Economist, Gülen se tornou uma das personalidades muçulmanas mais importantes do mundo – não apenas em sua terra natal, a Turquia, mas também em muitos outros lugares: Ásia Central, Indochina, Indonésia e África.
O Movimento Gülen foi iniciado na década de 1970 com Gülen e seu círculo de seguidores envolvidos em construção comunitária. No início o grupo utilizava acampamentos de férias como maneira de prover uma educação islâmica que complementaria a educação laica promovida pelo Estado. A partir de um pequeno círculo de membros de sua congregação em Izmir, as ideias de Gülen se cristalizaram em um movimento que se tornou um fenômeno significativo na Turquia e, agora, no mundo. Apesar de o Movimento só ter começado a fundar escolas e albergues para estudantes no fim da década de 1980, na Turquia, o Movimento hoje tem mais de 500 escolas em mais de 50 países, incluindo Europa, Ásia, América, África e Austrália, além de seis universidades na Turquia e Ásia Central. No sudeste asiático, essas escolas turcas ou Escolas Gülen, com são chamadas de vez em quando, foram estabelecidas na Indonésia, Camboja, Myanmar, Tailândia e Filipinas.
Após o colapso da União Soviética em 1994, o Movimento começou a trabalhar no exterior, abrindo instituições educacionais e expandindo negócios nas ex-Repúblicas-Soviéticas de língua turca na Ásia Central. Depois, ele se expandiu a outros Estados da antiga União Soviética, aos Balcãs e finalmente chegou ao Ocidente. O Movimento expandiu suas atividades para os EUA no fim da década de 1990. De acordo com o International Herald Tribune, essa mudança foi, parcialmente, associada à decisão de Fethullah Gülen de se mudar para os EUA em 1997, para escapar de perseguição na Turquia, buscar tratamento médico e influenciar o mundo.
Um dos aspectos mais importantes do Movimento é que ele não somente tem um volume enorme de seguidores e simpatizantes, mas também tem uma forte ligação às ideias de Gülen. Dessa forma, o Movimento, além de rico em recursos, é administrado por seguidores e apoiadores totalmente comprometidos.
Apesar de não haver um número oficial para confirmar esta asserção, diz-se que a comunidade do Movimento Gülen tem mais de seis milhões de seguidores. Nota-se que o Movimento, agora, foca em projetos de serviço globalizado, especialmente, no campo da educação e diálogo interreligioso e intercultural.
O forte apoio dos círculos empresariais ao Movimento Gülen se reflete de várias formas. Por exemplo, a comunidade controla uma das instituições financeiras de crescimento mais acelerado na Turquia, o Banco Asya (anteriormente conhecido como Asya Finans). Afiliados incluem, também, empreendimentos manufatureiros (a Têxtil Akbulut é a segunda maior na Turquia) e a indústria automobilística. Calik, um dos maiores investidores da Turquia, possui a maior fatia do Banco Asya, que pertence à rede de Fethullah Gülen.
Em pesquisa recente para determinar os 100 maiores pensadores, Fethullah Gülen foi votado o maior intelectual do mundo. Gülen, que é considerado um erudito islâmico, teve vitória esmagadora na pesquisa – organizada pela revista britânica Prospect e a americana Foreign Policy – com mais de 500.000 votos. O editor da Prospect, David Goohart, que admitiu nunca ter ouvido falar de Gülen antes, disse que os resultados indicam tendências políticas significativas na Turquia. “A vitória de Fethullah Gülen atrai atenção para o conflito mais importante na Europa, representado na Turquia pelo Estado nacionalista laico e os reformadores islâmico-democratas do Partido da Justiça e Desenvolvimento”, afirmou. Uma reportagem da Reuters descreveu Gülen como defensor de um Islã moderado, enraizado na vida moderna, apesar de também questionar se ele é uma ameaça ou benfeitor.
Referindo-se à mesma pesquisa, o The New York Times disse o seguinte: “Em contraste ao firmemente secularista Ataturk, Gülen – que, supostamente, tem mais de 5 milhões de seguidores e influência no Partido da Justiça e Desenvolvimento na Turquia – passou a vida toda promovendo diálogo interreligioso e pregando a reconciliação da ciência e instituições modernas com a fé religiosa. Os ensinamentos de Gülen são, em geral, caracterizados por sua ênfase na religião e ciência como complementares, em vez de contradirórias.
O texto de Ehsan Massod para a revista Prospect dizia: “O que Gülen diz é que você pode estar em casa, no mundo moderno, e ao mesmo tempo adotar valores tradicionais como fé em Deus e responsabilidade social – mensagem que ressoa fortemente na Turquia. Assim, o Movimento parece determinado a influenciar a sociedade e a política com uma fé islâmica tolerante, conservadora e tradicional. Por outro lado, Ataturk, o pai da República Turca, foi eleito o Homem do Século pela The Times Magazine em 2000.”
Apesar de um amplo espectro das ideias de Gülen terem sido discutidas em conferências e fóruns ou terem sido disponibilizadas em várias publicações, seus esforços para a paz continuam pouco conhecidos. Grande parte do trabalho de Gülen está centrado na construção de uma cultura de harmonia e paz com a fundação de instituições que encorajam diálogo intercultural e compreensão. Outra observação que pode ser feita é que, apesar das conquistas globais do Movimento, a representação de uma imagem positiva do Islã e Muçulmanos ainda é muito pequena na mídia. A esperança é que isso possa mudar conforme o Movimento Gülen ganhe reconhecimento ao redor do mundo.
Monami Haque*
* O autor é conferencista júnior no Departamento de Mídia e Comunicação da Independent University-Bangladesh (IUB).
Publicado em The Daily Sun, 29 de março de 2011.