Comitê da ONU contra a tortura questiona as leis de estado de emergência permanente da Turquia, tratamento de detidos e independência judicial
O Comitê das Nações Unidas contra a Tortura (CAT) concluiu a consideração do quinto relatório periódico da Turquia, destacando preocupações significativas em relação à adesão do país aos padrões de direitos humanos e legais, em questões que vão desde a permanência das leis de estado de emergência até o tratamento dos detidos e a independência do judiciário.
O comitê expressou alarme sobre relatos de que decretos de emergência promulgados após uma tentativa de golpe em 2016 se tornaram parte permanente da lei turca. Essas leis permitem períodos prolongados de detenção, significativamente superiores aos padrões internacionais, com algumas detenções se estendendo por até 36 dias para aqueles suspeitos de “cometer crimes coletivamente”.
Após a tentativa de golpe, o governo turco declarou estado de emergência e realizou uma purga massiva nas instituições estatais sob o pretexto de uma luta anti-golpe. Mais de 130.000 funcionários públicos, incluindo 4.156 juízes e promotores, bem como 24.706 membros das forças armadas, foram sumariamente removidos de seus cargos por suposta filiação ou relacionamento com “organizações terroristas” por meio de decretos de emergência não sujeitos a controle judicial ou parlamentar.
Deficiências na estrutura legal da Turquia em relação à tortura e maus-tratos também foram detalhadas. Embora a Constituição turca aborde a tortura, outros crimes são inadequadamente cobertos. Preocupações foram levantadas sobre a ausência de proibições explícitas contra confissões obtidas sob tortura no Código Penal turco e questões sobre se as proteções se estendem suficientemente às testemunhas.
Questões sobre a independência e responsabilidade do judiciário turco foram centrais na crítica. O comitê questionou o papel do Conselho de Juízes e Promotores (HSK) no controle das carreiras judiciais e citou casos de juízes e advogados sendo presos, especialmente após a tentativa de golpe. O caso de Aydın Sefa Akay, um ex-juiz da ONU preso apesar de apelos baseados em sua imunidade diplomática, foi notavelmente mencionado.
Preocupações sobre a Lei No. 6722, aprovada em 2016, foram abordadas. Esta lei introduz um procedimento especial de permissão para investigar militares acusados de tortura e maus-tratos, efetivamente fornecendo um escudo retroativo de impunidade. O comitê pediu que a Turquia esclarecesse sua política e medidas para combater a impunidade e garantir a responsabilidade de militares e pessoal quase-militar.
O comitê apontou rendições ilegais e a extradição de cidadãos turcos afiliados ao movimento Gülen, com base em medidas de contraterrorismo. Esses casos frequentemente envolviam tortura e detenção incomunicável, equivalendo a desaparecimentos forçados. O comitê expressou preocupação de que essas ações, realizadas pelo serviço de inteligência, frequentemente resultem em impunidade devido ao Artigo 6 da Lei No. 6532, que concede impunidade de fato aos agentes da Organização Nacional de Inteligência (MİT).
O presidente turco, Recep Tayyip Erdoğan, tem como alvo os seguidores do movimento Gülen, inspirado pelo clérigo muçulmano Fethullah Gülen, desde as investigações de corrupção de 2013, que implicaram o então primeiro-ministro Erdoğan, seus familiares e seu círculo íntimo.
Desconsiderando as investigações como um golpe e conspiração Gülenista contra seu governo, Erdoğan designou o movimento como uma organização terrorista e começou a alvejar seus membros. Ele intensificou a repressão ao movimento após o fracassado golpe de julho de 2016, que ele acusou Gülen de orquestrar. Gülen e o movimento negam veementemente envolvimento na tentativa de golpe ou em qualquer atividade terrorista.
As condições nas instalações de detenção turcas foram criticadas, em particular a superlotação, acesso limitado a serviços jurídicos e médicos e contato restrito com familiares para os detidos. O comitê pediu um melhor tratamento para mulheres e menores detidos e questionou as condições sob as quais as sentenças de prisão perpétua são cumpridas.
O comitê notou relatórios indicando que o número de prisioneiros sentenciados à prisão perpétua aumentou em 40% entre 2016 e 2022. O comitê pediu à Turquia que fornecesse uma explicação para esses números.
O fechamento de mais de 34 associações de advogados e inúmeros meios de comunicação por decreto presidencial levantou sérias preocupações sobre a liberdade de expressão e associação na Turquia. O comitê instou o governo turco a garantir que jornalistas e defensores dos direitos humanos possam trabalhar sem medo de represálias.
Apesar da estrutura legal da Turquia para combater a violência contra as mulheres, problemas persistentes, como feminicídio e suicídios forçados, continuam. O comitê expressou preocupação com a retirada da Turquia da Convenção de Istambul, vendo isso como um retrocesso para os direitos das mulheres e a proteção contra a violência de gênero.
Enquanto a Turquia é elogiada por hospedar o maior número de refugiados do mundo, o comitê destacou questões como baixas taxas de registro de nascimento entre crianças refugiadas e xenofobia crescente. A necessidade de melhores medidas de integração e proteção foi enfatizada.
O comitê pediu à Turquia que atualizasse suas estatísticas, aprimorasse programas de treinamento para as forças de segurança e garantisse a conformidade com os padrões internacionais de direitos humanos.