Sirnak na Turquia agora é nada além de escombros
A cidadezinha de Sirnak na Turquia se parecia com uma grande e poeirenta vila ligada administrativamente à província de Siirt, que foi transformada em seu centro em 1990. Ela acabou se tornando um ponto de foco na luta da Turquia contra o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), sempre ficando nas manchetes enquanto que as trincheiras eram escavadas e barricadas erigidas pela vestimenta de guerrilha urbana do PKK, as Unidades de Proteção Civil (YPS).
Um toque de recolher foi imposto em Sirnak em 14 de março, e uma operação massiva foi lançada para expulsar os militantes curdos. A operação durou 80 dias, mas o toque de recolher permaneceu em vigor por nove meses principalmente por causa de prédios que foram danificados na operação de segurança estavam caindo. Pensou-se inicialmente que apenas alguns prédios precisariam ser demolidos, mas uma contagem após a suspensão do toque de recolher determinou que cerca de 2.044 prédios estavam inutilizáveis.
Os residentes de Sirnak voltaram correndo de volta para casa depois que o toque de recolher foi suspenso, mas eles ficaram chocados com o que encontraram e com o que não conseguiram encontrar. As pessoas não tinham escolha a não ser tentar encontrar o que restava de suas casas.
Andando sobre os escombros com seu amigo Celadin Baran, Sait Batmaz procurava por sua casa. Os dois discutiam sobre a casa de quem eles estavam de pé. Baran disse que inicialmente parecia com sua casa, mas usando um prédio conhecido que não havia sido afetado, ele foi capaz de encontrar o que restava de sua residência – alguns pedaços de ferro e um pouco de escombros.
“Minha casa se foi. Estou ficando com o meu irmão. Minha casa foi incendiada com tudo dentro dela”, contou Batmaz ao Al-Monitor, profunda mente chocado.
Finalmente, Baran também localizou o que uma vez foi sua casa. Nove meses atrás, antes de ter deixado Sirnak, Baran era um comerciante abastado. Ele tinha 13 casas e cinco lojas. Enquanto assistia às máquinas trabalharem nos seus escombros, Baran disse que tinha deixado Sirnak e ido para Uludere com cinco de seus filhos.
“Aluguei uma casa lá por 150 liras turcas [cerca de R$ 145]. I não tinha emprego. Existia apenas um pequeno negócio de contrabando, mas nós não tínhamos acesso a isso”, conto ele ao Al-Monitor. “Agora estou de volta. Não me sobrou nada. Treze casas e cinco lojas totalmente destruídas pelo fogo. Com seis filhos, não nos resta nada. Nesses escombros nós tínhamos 10 apartamentos. Todos destruídos. Tínhamos uma casa de três andares na área comercial; ela não existe mais também. O estado não paga o nosso aluguel”.
Agora sentenciado à pobreza, Baran achou difícil expressar seus sentimentos. Ele observou as máquinas que removiam os escombros trabalharem por um tempo e então foi embora. Naquele momento, um homem se aproximando de nós disse: “Nós somos todos culpados por isso”, e então ele foi embora rapidamente antes que pudéssemos lhe perguntar qualquer coisa.
Conforme os escombros eram removidos, estava claro que todos os pertences e móveis tinham desaparecido. O Partido Democrático Popular (HDP) alegou que quaisquer móveis que sobraram foram dados às companhias que estavam limpando os escombros – as autoridades não confirmaram isso, e nenhuma pista foi encontrada para verificar essa informação. Independentemente disso, como alguém poderia acreditar que qualquer coisa utilizável teria restado nos prédios que não mais existem?
Ainda assim, as pessoas estão tentando recuperar qualquer coisa que puderem. Uma mulher que cavava atrás de pedaços de madeira se identificou como Kevser Aydin. Ela nos contou que tinham escapado até sem levar as roupas de seus filhos. Sua tarefa agora é coletar madeira para ficar aquecida no inverno que está chegando. Ela disse que está vivendo em uma casa que alugou com sua família de sete pessoas.
“Todos os nossos pertences se foram. Estamos escavando por aí a busca do que for que encontrarmos. A madeira nós precisamos para o inverno porque não temos mais nada para aquecer a nossa casa. Nós tínhamos uma casa de três andares completamente mobiliada, e agora nada”, contou ela ao Al-Monitor.
Yasin Yilmaz também estava tentando recuperar madeira dos escombros de sua casa. Ele havia procurado por um longo tempo por ela sem sorte alguma, até que alistou a ajuda dos mais velhos da cidade que ajudaram fazendo uso de características do terreno e árvores. “Nós nos salvamos escapando. Minha família está espalhada por todos os lugares. Alguns estão em Mersin, em Siirt e Guclukonak. Temos estado longe de casa por nove meses”, disse Yilmaz. “Agora estamos de volta, e não conseguimos sequer encontrar traços de nossa residência. Temos alguns escombros, mas não paredes. Apenas esperamos poder recuperar um pouco de madeira para usar no aquecimento”.
Sirnak se parece com um terreno plano, sem nada. Apenas algumas mesquitas restam de pé no centro da cidade, mas mesmo elas estão gravemente danificadas.
Alguns sortudos encontraram casas para alugar. Outros continuam a viver em barracas para onde se mudaram nove meses atrás quando o toque de recolher foi imposto.
Hazal Kozuman, que tem vivido em uma barraca por nove meses, disse que todas as 20 casas pertencentes a sua família foram devastadas.
“Não temos casa alguma; eles devastaram o nosso prédio. As crianças estão espalhadas por todos os lugares – passaremos o inverno na barraca. Não há mais casas de parentes em que possamos nos refugiar”, contou ela ao Al-Monitor.
Essa é a nova Sirnak: barracas, escombros e famílias despedaçadas e dispersas. Você pode sentir como é a nova Sirnak quando você entra na cidade. Os pontos de controle erigidos na entrada da cidade fazem lembrar do Iraque. Quando te pedem para registrar quando você entra na sua própria cidade, você sente como se estivesse entrando em uma terra estrangeira. Alguns consideram o PKK como responsável pela destruição, dizendo: “Se eles nãos tivessem trazido os conflitos para o centro da cidade, isto não teria acontecido”.
Alguns culpam o estado, dizendo que ele exagerou na reação às trincheiras e barricadas. Se uma conclusão para essas recriminações ocorrer ou não, a realidade é que Sirnak foi transformada em escombros, milhares de pessoas estão sem casa e o futuro é incerto.
Mahmut Bozarslan
Fonte: www.al-monitor.com