Turquia a beira de um banho de sangue
agosto 04
10:57
2016
Nesta quarta-feira, a partir das 18h, você acompanha entrevista completa com Kamil Ergin, Coordenador da Plataforma de Mídia do Centro Cultural Brasil-Turquia (CCBT) e correspondente da agência de notícias Cihan, desde 2007, para o programa “Na sala de visitas com Luis Nassif”.
Após a tentativa frustrada de golpe na Turquia, o primeiro-ministro Recep Erdoğan iniciou uma onda de ataques aos opositores incluindo o fechamento de veículos de comunicação críticos ao seu governo. Erdogan está no terceiro mandato contabilizando 13 anos como chefe de estado na Turquia.
Ergin conta que desde o início do seu mandato, o primeiro ministro procurou controlar a mídia. “No início ele teve pouco apoio, mas aos poucos, um por um, ele conseguiu combater a mídia. Fez negócios com grupos econômicos que atuam na área de mídia e conseguiu atuar nessas áreas e revender [redes de comunicação] para outros grupos econômicos e assim conseguiu se fortalecer ao longo desses 13 anos, com o apoio da mídia”.
A Cihan, por exemplo, que em Turco quer dizer globo, é um dos principais veículos de comunicação no país. Ergin destaca o veículo esteve à frente da divulgação da investigação policial sobre um esquema de corrupção que envolveu quatro ministros e o próprio filho de Erdogan. Isso foi em 2013. A partir daquele ano o primeiro ministro começou a perseguir o conglomerado de mídia afirmando publicamente que as notícias se tratavam de uma tentativa de golpe contra ele.
“Ele começou a cortar anúncios, a deportar jornalistas estrangeiros que trabalhavam dentro do grupo, ameaçar os empresários que faziam anúncios, abriu alguns processos contra jornalistas e diretores do jornal. Alguns inclusive estão presos”.
Erdogan subiu ao poder em 2002, em meio a um “clima pesado na economia” e na política, herança do golpe militar de 1997. Após sucessivas coalisões políticas, o país não conseguia acertar o ponto certo para a implantação de um governo capaz de trazer desenvolvimento econômico e equilíbrio social.
Erdogan se filiou a um partido político islamista fechando durante o golpe de 97. Em 2002, junto com uma equipe desse partido criou o Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP), negando a ligação com o islamismo e com promessas de tendências políticas modernizadoras liberal-democrata e de levar a Turquia para a União Europeia.
“Ele chegou ao cenário político defendendo que seria a voz das minorias no parlamento. Assim ele ganhou o apoio de vários grupos diferentes”. Ergin, destaca que nos primeiro e segundo mandatos de Erdogan a Turquia de fato avançou no âmbito econômico e social, assinando acordos com outros países, e aumentando o protagonismo na política externa.
“A Turquia é o único país no Oriente Médio com laços com Israel, Palestina, Irã, Rússia e Estados Unidos, então era um intermediador. [Nesses últimos anos] foi um momento em que realmente a Turquia brilhou e desenvolveu muito sua econômica”, disse.
A radicalização política começou quando Erdogan iniciou mudanças dentro do exército. O setor militar na Turquia é uma área bastante delicada, foi de lá que nasceram os dissidentes responsáveis pelos quatro golpes de estado que o país acumula na história recente, nos anos 60, 71, 80 e 97.
“Em 2010, início do terceiro mandato, ele abriu um referendo para retirar a anistia de generais que fizeram parte dos golpes, e 250 chefes militares foram presos após esse referendo. Esse foi o momento em que Erdogan se sentiu livre para colocar sua própria agenda”, explicou o correspondente.
Ou seja, apesar de trazer dentro dos seus quadros tendências extremistas, o exército funcionava, até então, como um contra peso ao poder executivo de Erdogan. A partir de 2010 o primeiro ministro aproveitou que seu partido tinha a maioria das cadeiras no parlamento para fazer mudanças na constituição em seu favor. “Assim que começou a mostrar uma tendência mais autoritária, sem consultar a ninguém e também sem ter apoio dos partidos de oposição”.
Em 2013 uma onda de manifestações contra seu governo começaram na Praça Taksim fortemente reprimida pela polícia. “Interessante que naquela mesma época teve manifestações no Brasil e a reação da Dilma foi que tinha que ouvir a voz das ruas e temos que abrir mais espaço para a democracia. Na Turquia o Erdogan ameaçou as pessoas na praça dizendo que eles representavam 50% dos votos, ou seja, ‘50% estão em casa esperando o meu sinal para sair às ruas”, relembrou Ergin.
E Erdogan tem popularidade de cerca de metade da população, reconhece o correspondente. Na mais recente tentativa de golpe, o primeiro ministro aproveitou para medir sua força. Mesmo após conseguir sufocar o levante em poucas horas com o auxílio da mídia e da população, decretou estado de emergência e suspendeu temporariamente a Convenção Europeia dos Direitos Humanos e iniciou uma perseguição aos críticos do seu governo.
Lilian Milena
Na sala de visitas recebe correspondente Kamil Ergin que denuncia escalada de violência promovida pelo governo turco, após tentativa fracassada de golpe