UE teme que líder turco use golpe para ampliar repressão a opositores
Os líderes europeus esperam que Erdogan reconheça que muitos dos seus oponentes políticos se opuseram veementemente à tentativa de golpe e vai reagir desacelerando sua campanha para concentrar o poder na presidência. Mas, com a prisão de milhares de pessoas que supostamente foram solidárias aos conspiradores por trás do golpe fracassado, esta é mais uma esperança do que uma expectativa.
“O instinto e a prioridade de Erdogan serão agora reprimir a dissidência e consolidar o poder”, diz Mujtaba Rahman, diretor para a Europa da consultoria Eurasia Group.
Donald Tusk, que preside reuniões entre líderes da União Europeia, resumiu a questão do ponto de vista da UE: “A questão-chave será que tipo de Turquia emergirá dessa crise. Como a Turquia vai lidar com as consequências será crucial não apenas para a Turquia, mas para toda a região e para as relações entre a UE e a Turquia”, diz.
A chanceler alemã, Angela Merkel, em reação ao episódio, mencionou especificamente a oposição política ao governo de Erdogan. “Nós somos guiados por solidariedade a todas as forças políticas no governo e da oposição”, disse ela.
Manfred Weber, aliado de Merkel e líder do partido da chanceler no Parlamento Europeu, disse ontem que “o governo turco deve agora abster-se de ações que possam levar o país a se afastar mais da Europa”. Segundo ele, a Turquia e a UE têm interesse em uma parceria estreita em áreas como crescimento econômico e imigração.
Mas a UE pode precisar mais da Turquia do que o contrário. Marc Pierini, ex-embaixador da Turquia na UE até 2011, disse que o Ocidente precisa de Erdogan para combater o Estado Islâmico e conter a onda de imigrantes rumo à Europa. Como resultado, ele prevê que o Ocidente não vai ficar batendo na tecla da democracia.
Sinan Ulgen, especialista em política turca do centro de estudos Carnegie Europe, com sede em Bruxelas, diz que “o instinto político da UE é falar sobre valores, mas, nessa altura, os valores não importam muito. Não há uma verdadeira obrigação por parte de Erdogan de mudar o curso”.
Em março, a UE fechou um acordo com a Turquia que garantia o apoio do país para manter os refugiados em seu território em troca de ajuda, um avanço nas negociações sobre a entrada de Turquia na UE e o fim da exigência de visto para os cidadãos turcos que querem viajar para os países do bloco. Mas alguns governos, liderados pela França, estão muito relutantes em suspender a exigência de visto. Negociações sobre o tema estão previstas para ocorrer em outubro.
A resposta à tentativa de golpe “complicou a cooperação com a Europa sobre os refugiados, à medida que dá mais voz ao já suscetível eleitorado da UE com relação a ligações mais próximas com a Turquia”, diz Rahman, do Eurasia Group. “Manter a união unida sobre um acordo, em outubro, para suspender [a exigência de] visto para os cidadãos turcos será agora muito mais difícil”, diz ele.
Para obter um acordo do gênero, a Turquia terá que levar adiante algumas pequenas concessões que prometeu para amenizar as suas leis antiterror. Isso agora parece algo duvidoso e se a Turquia reinstaurar a pena de morte, as negociações do acesso à UE podem ser suspensas. Mehmet Muezzinoglu, vice-líder do partido governista Partido da Justiça e do Desenvolvimento, publicou no Twitter uma mensagem sobre a restauração da pena de morte para os soldados rebeldes.
Mais de um milhão de refugiados e outros imigrantes entraram na Alemanha e nos países escandinavos no ano passado. Desde o acordo fechado em março entre a UE e a Turquia, o número caiu dramaticamente.
Mas o acordo com a Turquia não é a única razão para essa queda. Desde o ano passado, as fronteiras nacionais nas principais rotas dos refugiados vindos pela Grécia e pelos Bálcãs rumo ao norte da Europa estão fechadas. Isso tem impedido que esses imigrantes sigam adiante, depois de terem feito a custosa travessia da Turquia para Grécia, onde as condições de vida para os refugiados podem ser tão ruins ou mesmo piores do que na Turquia.
Merkel, cujo governo sentiu a pressão do influxo de imigrantes, e o resto da UE podem, portanto, não precisar de Erdogan tanto quanto precisavam há um ano. Mas desistir do acordo fechado em 2015 sobre os imigrantes é um passo que os governos europeus vão hesitar em dar.
Por STEPHEN FIDLER
(Colaborou Valentina Pop.)
Fonte : http://br.wsj.com/articles/SB12666875110462664169504582195671601284802?tesla=y