Golpe vai ajudar Erdogan a governar com mão de ferro
Não há nada mais pernicioso ao Estado de direto e às instituições democráticas do que um governo de corte autoritário —ainda que eleito democraticamente— sofrer um golpe militar.
O fracasso do golpe decorreu graças à ausência de apoio popular aos militares dissidentes e face à falta de adesão dos principais comandantes militares, fragmentando as Forças Armadas. No fundo, foi uma trágica presepada e um desserviço à democracia do país.O que já estava ruim pode ainda piorar. No plano interno, a perseguição aos meios de comunicação, aos políticos de oposição e a intimidação do Judiciário seguirão sendo parte dos traços da deterioração da situação política do país.
Após 13 anos de hegemonia, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, arremessou o país em um emaranhado de problemas domésticos e internacionais.
A expansão do autoritarismo sobre os setores público e privado em todos os níveis e as equivocadas decisões diplomáticas na esfera regional, puseram a Turquia na rota do terrorismo e aprofundaram a clivagem social. Além disso, gerou ainda a repressão política e a supressão indiscriminada a grupos étnicos, como os curdos.
Se Erdogan já tinha uma tendência autoritária beirando a um namoro ditatorial, agora, mais do que nunca, ele poderá conseguir governar com mão de ferro.
O que o presidente turco não conseguiu no Parlamento com suas manobras para avocar poderes constitucionais e modificar o regime de governo, alcançará agora. Fortalecido desse imbróglio, Erdogan usará todas as fendas para consumar o seu desejo e se perpetuar no poder.
Em uma analogia distante, remanesce a ligeira sensação de que o golpe na Turquia terá “efeitos políticos” similares ao que aconteceu na Venezuela após o golpe contra o ex-presidente Hugo Chávez: Recrudescimento da força governante, perseguições políticas e aparelhamento das instituições estatais.
No fundo, nos últimos anos, o ponto de fraqueza do governo Erdogan, seja nos contextos interno e externo, consiste em sua ambivalente política que circunda o conflito sírio. O seu velado suporte ao Estado Islâmico e sua pendular política na relação com a União Europeia acabaram minando a força de seu governo em diversos tabuleiros políticos.
COLUNISTA DA FOLHA