Como Erdogan protegeu e apoiou o ISIS?
Após a frustrada tentativa de golpe em 15 de julho, a Turquia encontra-se em uma situação muito complicada. David Gardner, especialista em Oriente Médio, escreveu para o Financial Times: “A OTAN e o Ocidente correm sério risco com o atual posicionamento político estratégico da Turquia. Erdogan priorizou o combate ao Movimento Gülen e aos rebeldes curdos como questões de segurança, quando deveria se unir ao Ocidente no combate ao ISIS”. Erdogan considera a questão dos curdos e do Movimento Gülen prioritárias e as questões que envolvem a presença do ISIS, na Turquia, passaram a ser insignificantes.
Não é simples coincidência que, durante o mandato de Tayyip Erdogan, a Turquia se transformou em um “corredor” para o ISIS. Yusuf Muftuoglu, que, por muitos anos, foi assessor de política externa do ex-presidente Abdullah Gül, melhor amigo de Erdogan, escreveu sobre isso em artigo para o site Huffington Post, no dia 5 de julho: “A partir do momento em que Erdogan e a Turquia deram seu aval aos movimentos de ideologia salafista radicais, estabeleceu-se com clareza a prioridade da derrubada de Assad (Síria). Os jihadistas combatiam em territórios Sírios durante o dia e, à noite, voltavam para dormir em solo turco. ”
Pela primeira vez, um especialista do governo confessou abertamente a relação de Erdogan com o grupo ISIS. Nessa clara afirmação feita por ele, Erdogan já havia traçado seus planos para colaborar com a derrubada de Assad (Síria) desde o início de março de 2011, quando começaram os movimentos guerrilheiros na Síria. Erdogan deu livre passagem a todos os jihadistas que vinham de países asiáticos e ocidentais com destino à Síria.
O dia 28 de junho de 2016 é uma data que mostra claramente a relação entre o ISIS e Erdogan. O atentado ao Aeroporto Internacional Ataturk (Istambul), que, há anos, serve de livre passagem para milhares de terroristas, foi realizado por três militantes do ISIS e deixou 50 mortos e centenas de feridos. Os terroristas do ISIS que realizaram o atentado eram de descendência centro-asiática e caucasiana. Porém, o mais interessante é que um dos terroristas havia acabado de sair de uma prisão turca. Isso não surpreende, pois, nos tribunais turcos em que a maioria dos processos de participantes do ISIS são julgados, não há detenção de réus. Sobre o atentado em Istambul, o anúncio mais chocante foi o da Rússia. O porta voz do Kremlin chamou atenção ao afirmar que os nomes dos terroristas já haviam sido entregues às autoridades turcas. Porém, em vez de prendê-los, elas preferiram poupá-los.
David Gardner afirmou que, nas visitas de Erdogan a alguns países da Ásia Central, sua prioridade não era falar da luta contra o ISIS, seu alvo era o Movimento Gülen. Quando Erdogan foi ao Cazaquistão, o presidente cazaque, Nursultan Nazarbayev, disse a Erdogan: “Sr. Erdogan, deixe de falar das escolas do Movimento Gülen. Devemos falar sobre o ISIS. Por que os jovens do seu país estão participando do ISIS?”
No dia 28 de abril, em uma reunião internacional na cidade de Almaty, no Cazaquistão, Yerlan Karin, presidente do Centro de Pesquisa Estratégica do Cazaquistão, comentou sobre a participação de jovens turcos no ISIS, a partir de observações feitas em suas viagens à cidade fronteiriça de Hatay (Turquia-Síria): “Antes, os jovens usavam a via do Cáucaso – Irã e Paquistão – para chegarem ao Afeganistão. Era um longo trajeto, mas após o início da guerra na Síria, o caminho encurtou. Eles vão de Istambul direto para Síria. Os terroristas procedentes da Ásia Central, dos antigos países soviéticos, reúnem-se e formam as milícias na Síria. Por exemplo, o Partido Islâmico do Turquestão deixou o ISIS para se juntar ao Al-Nusra e outros grupos. Eles se tornam líderes, chefes, comandantes de grupos. No futuro, eles retornarão para seus países, as antigas repúblicas soviéticas, com esses movimentos e formarão novos grupos de elite. Isso é muito perigoso”.
Muitos episódios de ajuda à manutenção do ISIS ocorreram no governo de Erdogan. Por exemplo, em julho deste ano, o terrorista Ahmet Gunes, que aparece em vídeos de execução do ISIS, saiu da prisão e fugiu para Síria através de uma carta da inteligência turca recebida pelo seu advogado.
Joby Warrick, famoso por seus livros sobre o ISIS (prêmio Pulitzer), escreveu para Washington Post: “A Turquia, mesmo após o atentado ao Aeroporto de Istambul, ainda mantém relações com o ISIS e seus grupos radicais. O comportamento de Erdogan quanto ao ISIS é esquizofrênico”. Isso surpreende. Há muitas informações que comprovam a observação dele. De acordo com artigo publicado pela BBC turca no dia 6 de julho, 2.930 integrantes do ISIS utilizaram, por quatorze meses, três passagens existentes entre Turquia e Síria.
O Rei Abdullah, da Jordânia, segundo artigo publicado na revista Foreign Policy em junho de 2016, disse em um encontro em Washington: “O próprio Erdogan encaminha os militantes do ISIS para o ocidente”.
Outras informações comprovando o apoio logístico do governo de Erdogan ao ISIS foram publicadas no jornal New York Times em 30 de junho de 2016, a matéria do jornal conta que os “chips” dos celulares encontrados em posse de guerrilheiros estrangeiros do ISIS, na Síria, foram comprados na Turquia, e seus gastos foram pagos com dinheiro sacado nos bancos turcos.
O jornal New York Times, em 2014, divulgou fotos de membros do ISIS recrutando dezenas de pessoas na frente de mesquitas na Turquia. Erdogan culpou o jornal afirmando: “Isso é vergonhoso, humilhante e difamador”.
Além do mais, o jornal New York Times do dia 14 de setembro de 2014 confirmou em manchete: “Há militares, na Turquia, que constantemente participam do ISIS. ”
A Turquia enviou somente militantes para a Síria? Não. Armas, também. Centenas ou milhares de caminhões, conforme certas informações, foram enviados com armas pesadas. Alguns caminhões foram capturados por policiais militares na fronteira da Síria. Can Dundar, editor geral do jornal turco Cumhuriyet, quando publicou a matéria sobre a captura desses caminhões, foi detido por policiais sob acusações de “espionagem” e ficou preso durante três meses. O jornalista só foi liberado devido a pressões vindas da Europa e dos EUA.
Há informações de que os comandantes militares que estavam na fronteira da Síria e promoveram as operações de captura destes caminhões ainda estão presos e sendo julgados por traição à pátria.
Esses são somente alguns dos exemplos da relação entre Erdogan, o ISIS e outros grupos radicais na Síria. Alguns dados indicam o comércio de petróleo entre os partidários de Erdogan e o ISIS. O jornal The Observer publicou a relação entre a Turquia e Ebu Sayyaf, ministro do petróleo do ISIS, morto em operação dos EUA em maio de 2015.
Uma parte da matéria publicada no jornal The Observer diz: “O comércio entre a Turquia e grupos jihadistas mostrou-se verdadeiro. Pelas estimativas, desde o início de 2013, em um período de seis meses, o valor diário da negociação de venda do petróleo do ISIS foi estimado entre 1 e 4 milhões de dólares. Com esse recurso financeiro, a organização que possuía condições limitadas pôde transformar suas estruturas para atrair guerrilheiros estrangeiros, ameaçado as fronteiras entre os dois países. ”
Este é um curto relato da intrincada relação entre Erdogan e o ISIS.
Pela primeira vez, registrou-se no congresso norte americano que a Turquia ajudou, por anos, o grupo Al-Nusra, braço direito da rede Al Qaeda.
Se as empresas de energia e petróleo fossem investigadas, poderíamos alcançar a identidade dos reais beneficiários do comércio de petróleo feito pelo ISIS.