Nova política externa da Turquia é sustentável?
A motivação por detrás dos recentes gestos de política externa de reconciliação do presidente turco Recep Tayyip Erdogan para com outros países na região é questionável, mas não há dúvidas de que essas ações tinham que ser tomadas.
A repórter do New York Times Sabrina Tavernise escreveu em seu artigo de 5 de julho intitulado “Líder turco Erdogan faz novos inimigos e frustra antigos amigos” que Erdogan “tinha se tornado tão solitário que na semana passada ele passou a fazer acordos com a Rússia por causa do caça abatido e com Israel por causa dos vários ativistas turcos mortos em uma flotilha com destino a Gaza em 2010”. Ela citou-me quando falava do assunto: “Creio que isso seja um indicador de quão desesperados estão”.
Quaisquer que sejam as razões por detrás das mais recentes ações turcas, esses paços foram essenciais. Eles contribuirão para a sobrevivência política de Erdogan e demonstram o proceder não de um zelote ideológico mas de um pragmatista político, e devem ser vistos como um trunfo para qualquer operador político.
Depois das ações da Turquia para se reconciliar com a Rússia e Israel, há agora sinais de intenções similares com o Egito e até a Síria. Saban Disli, vice-presidente do governante Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP), indicou que a Turquia possa planejar restaurar as relações com ambos os países.
É uma segredo aberto que a Arábia Saudita tem mediado entre Ancara e Cairo por um tempo, e tem havido um rumor por algum tempo de que a Argélia esteja atuando como um intermediário entre Ancara e Damasco. Desde que uma nova página se abriu com a Rússia logo após as desculpas de Erdogan ao presidente russo Vladimir Putin, Moscou também se tornou um mediador entre Síria e Turquia, cuja animosidade um para com o outro tem sido aparentemente irreconciliável desde o outono de 2011.
Uma virada brusca nas relações com a Rússia e Israel fizeram muitas pessoas na Turquia pensar que uma reconciliação com o Egito e Síria pode ser bem possível, dado o pragmatismo e flexibilidade de Erdogan.
Mas a pergunta permanece: A mudança na política externa da Turquia – mesmo se for uma consequência do desespero – é meramente uma mudança temporária de atitude sem nenhuma chance de sustentabilidade, ou é uma completa reforma que sugere que a Turquia está navegando para uma nova direção?
As respostas para essas perguntas estão diametralmente opostas umas às outras, apesar de compartilharem uma dinâmica em comum: até mesmo a ostensível reconciliação alcançada com Israel e Rússia estão longe de serem acordos fechados de cooperação e amizade reconquistada. Ainda mais, existem formidáveis obstáculos no caminho de relações suaves com ambos.
O prospecto de reconciliação com a Rússia é bem atraente para a Turquia, com significantes benefícios em potencial. E o pedido de desculpas de Ancara para Moscou promete aliviar um pouco da tensão. Mas os dois lados ainda estão longe de uma verdadeira reconciliação.
Do primeiro-ministro russo Dmitry Medvedev até a porta-voz do ministro das relações exteriores russo Maria Zakharova, autoridades advertiram que o pedido de desculpas turco não irá imediatamente limpar tudo.
Aurel Braun, professor de relações internacionais e associado do Centro Davis para Estudos Russos e Eurasianos da Universidade Harvard, destacou o seguinte: “Erdogan está agindo muito provavelmente de forma tática no momento, e se conseguir estabilizar e solidificar sua posição domesticamente, ele poderia rapidamente alterar as relações com a Rússia. Consequentemente, todos os atores internacionais seriam espertos, incluindo a Rússia, quando lidarem com Erdogan reconhecerem as múltiplas variáveis negativas envolvidas, sejam elas a inerente instabilidade do regime de Erdogan ou a personalidade imprevisível e cínica do líder turco, exercer extrema cautela ao melhorar as relações e insistir em todas as fases em contrapartidas claramente definidas”.
Parece que isso é o que os russos intencionam fazer.
Uma reconciliação sustentável com Israel é ainda mais incerta. Apesar de que o acordo melhorou a reputação doméstica do primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, vários observadores apontaram falhas potencialmente fatais no acordo.
Um desses observadores é Michael Koplow, diretor de política do Israel Policy Forum (IPF). Em seu artigo sobre Relações Exteriores, “Terrorismo e o acordo da Turquia com Israel – A cooperação funcionará?” ele levantou dúvidas acerca do cumprimento da Turquia de seus comprometimentos com Israel, indicando que estão fadados a esbarrarem contra os limites das políticas domésticas e a influência regional da Turquia. Para Koplow, a falha mais marcante do acordo é que ele depende de uma calmaria contínua em Gaza, o que parece improvável. “Apesar de que ninguém consegue prever, com certeza, quando outra guerra em Gaza estourará, outra rodada de conflitos parece inevitável, e com ela virá o fim do atual desanuviamento israelense-turco”.
Tem-se também que considerar que o Egito gostaria de ver a Turquia defender os direitos palestinos em Gaza e assim pode não facilmente se conformar com a Turquia tomar um papel de liderança no leste do Mediterrâneo.
Para Israel, relações mais próximas com o Egito tomam precedência sobre as com a Turquia. Esse elemento geopolítico aponta para as dificuldades aguardando a melhora das relações turco-egípcias.
O aspecto mais importante da nova mudança radical na política externa turca é que ela não ocorreu a partir de uma posição de força. Ela não é o resultado de um proceder bem estudado e conceitualizado.
Pelo contrário, ela vem de uma posição de fraqueza e tem a ver com o instinto de sobrevivência de Erdogan. Os alvos dos avanços turcos estão bem conscientes desse fato.
Fonte: www.al-monitor.com