O Ramadã, a economia e o bem-estar das pessoas
O Ramadã de 2016 começa hoje, segunda-feira dia 6 de junho. Nos próximos 30 dias, muçulmanos de todo o mundo praticarão o jejum ritual, desde a hora que o sol nasce até o momento em que o Sol se põe.
Para os muçulmanos de Jacarta, na Indonésia, isso significa que eles só poderão comer e beber qualquer coisa entre as 17:45 de um dia e as 6:00 da manhã do dia seguinte.
Parece difícil, mas para os muçulmanos de Istambul, na Turquia, a tarefa é mais complicada: comida e bebida só entre as 20:30 de um dia e as 5:30 do dia seguinte.
Será que o ele tem implicações para a economia desses países?
Os dias do Ramadã variam conforme o ano (por exemplo, no ano que vem, ele começará dia 27 de maio). Em alguns lugares, essas variações modificam bastante o período do jejum. Por exemplo, quando ele cai no final de dezembro, no inverno de Istambul, jejum só entre as 7:30 e as 16:45. Em Jacarta, as variações são bem menos relevantes.
Filipe Campante e David Yanagizawa-Drott, pesquisadores da Harvard Kennedy School, utilizaram essas variações para testar o efeito do Ramadã na economia.
A ideia é a seguinte: é possível comparar, de maneira informal, o que acontece com as economias da Turquia e da Indonésia quando o ele cai em dezembro (o período de jejum é bem mais curto na Turquia) e quando cai em junho (o período de jejum é bem mais longo na Turquia). Será que a economia da Turquia vai relativamente melhor quando o Ramadã é mais curto?
Métodos estatísticos apropriados permitem estimar esse efeito de maneira formal, utilizando uma base de dados com todos os países de maioria muçulmana e todos os anos desde 1950.
Campante e Yanagizawa-Drot encontram de fato um efeito negativo substancial de um Ramadã mais longo sobre a economia.
Um Ramadã longo (como o da Turquia em 2016) reduz o crescimento do PIB do país no ano em pouco mais de 1 ponto percentual quando comparado a um Ramadã mais normal.
É efeito do Ramadã mesmo? Não pode ser alguma outra coisa que acontece, por acaso, mais ou menos na mesma época do Ramadã? Se fosse esse o caso, esse efeito deveria estar presente em países não muçulmanos, mas os pesquisadores não acham efeito algum para essa amostra de países.
A estimação utiliza as diferenças no período de jejum do Ramadã, mas o resultado sugere uma conclusão mais geral: ele é uma prática religiosa com um custo econômico.
Só que o trabalho não para aí.
Campante e Yanagizawa-Drott estimaram também o efeito de um Ramadã mais longo sobre as respostas das pessoas em questionários sobre felicidade e bem-estar, do mesmo modo que estimaram o efeito sobre o PIB.
Em média, nas respostas a esses questionários, as pessoas se dizem mais felizes quando o Ramadã é mais longo que o normal.
Os resultados sugerem, portanto, que o Ramadã é um ritual com custos econômicos que traz uma sensação de bem-estar para os fiéis. Eu acho que essa conclusão concorda com uma visão comum sobre a religião.
Dados de questionários não são dados ideais, mas nesse caso não temos dado melhor para tentar medir variações na sensação de bem estar de uma pessoa. Se as pessoas se dizem mais felizes, quem sou eu para duvidar? Então, para quem for participar, bom Ramadã.
Referência:
– O artigo citado é “Does Religion Affect Economic Growth and Happiness? Evidence from Ramadan”, de Filipe Campante e David Yanagizawa-Drott, no Quarterly Journal of Economics 130, 615-658 (2015).
– Uma outra visão econômica da religião é que os rituais religiosos são custosos, mas fazem parte de um todo que traz benefícios para a comunidade.
Por Bernardo Guimarães