Quais são raízes do reacionarismo muçulmanos?
Recentemente o medo no mundo está aumentando por causa dos ataques terroristas do ISIS. Muitos que não conhecem a sua história fazem perguntas para entender qual a motivação desses grupos radicais. Temos que voltar no tempo para entender os dias de hoje, e como surgiram grupos extremistas e radicais que defendem a ideia de matar e morrer em nome do Islã.
Após a morte do profeta Mohamed (que a paz esteja sobre ele) a liderança da comunidade muçulmana passou para os chamados ‘Califas’. Contando trinta anos do seu falecimento, quatro Califas o substituíram. Eles foram seus seguidores fiéis e escolhidos pela sociedade entre os nomes mais fortes da época. Houve conflitos na eleição do quarto Califa e começaram lutas de poder entre as famílias que resultaram no surgimento de reis com o título de ‘Califa’, que começou a ser passado de pai para filho. Existiram 117 Rei-Califas até o fim dessa doutrina, que foi abolida pelo Atatürk, na Turquia, em 1924.
Na sua história de 1300 anos, o mundo islâmico teve altos e baixos, dependendo do poder dos estados que foram governados pelos Rei-Califas. Durante esta história surgiram somente duas seitas: “Sunitas” e “Xiitas”, que viviam em paz entre si. Com abolição da doutrina do Califado, “o mundo islâmico” morreu e nasceram “países separados com a população muçulmana em maioria”.
A partir do ano de 1924 até hoje, surgiram dezenas de interpretações novas do Alcorão e da vida do profeta como um modelo. Após este momento, a percepção da religião avançou em três linhas separadas:
1- Islã reacionário que defendeu a volta à força da Sharia aos muçulmanos e uma luta armada contra os supostos inimigos, que são não-muçulmanos e forças imperialistas. Este movimento nunca se integrou com o mundo moderno e seus frutos foram grupos como o ISIS, Al-Qaeda, Talibã, Al-Shabaab, etc. Estes grupos foram chamados de ‘organizações terroristas’ no mundo todo. Países como a Arábia Saudita, Irã, Afeganistão e Indonésia mantiveram a Sharia com o uso da força e mandatos autoritários.
2- Islã politizado que defendeu o uso de sistemas democráticos para chegar ao poder e aplicar uma agenda islâmica para transformar a sociedade. Este movimento foi representado pela Irmandade Muçulmana (Egito), Hamas (Palestina), Jamaat-e-Islami (Paquistão), AKP (Turquia) etc. Estes movimentos políticos sempre representaram a oposição ao poder estabelecido em seus países, com duas exceções: A Irmandade Muçulmana (1 ano) e AKP (13 anos). A Irmandade Muçulmana falhou em transformar a sociedade e sofreu um golpe militar em curto prazo. O AKP conseguiu tornar-se um modelo por muitos anos durante o tempo em que se posicionava como liberal e democrata. Assim que deu início a transformação da sociedade, recebeu protestos fortes (Parque Gezi) e se tornou autoritário.
3- Islã moderado que defendeu investir no ser humano, usando os próprios recursos da sociedade, mantendo um sistema fechado entre os muçulmanos para preservar seus valores e criar uma classe de sábios e intelectuais, abrindo escolas religiosas ou construindo mesquitas. Estes movimentos obtiveram sucesso até um certo ponto, sofrendo muita perseguição dos políticos e críticas do mundo todo. Muitos permaneceram como movimentos locais, com poucos seguidores e instalações modestas. A maioria se tornou aliada aos políticos e governos, perdendo sua independência e credibilidade. Não conseguiram motivar as pessoas e contribuir para um mundo sem fronteiras.
O Hizmet pode ser considerado um movimento civil que segue uma linha moderada também. No entanto, a proposta dele é muito mais ampla e sua estratégia é bem diferente dos outros movimentos religiosos. Diferentemente dos outros, o Hizmet começou abrindo escolas seculares e deu espaço ao ensino das ciências. É assim que conseguiu criar uma classe de intelectuais educados que ocuparam cargos importantes na sociedade. Também negou uso do apoio político e nem aceitou capital estrangeiro. Diferentemente de todos os movimentos islâmicos, incentivou seus seguidores ao diálogo inter-religioso. Ao contrário dos outros grupos, ele abriu seus canais de comunicação ao mundo inteiro, fundando escolas, centros culturais, empresas de mídia, entidades que levam ajuda humanitária e muito mais. Ele combate quatro problemas gerais do mundo e luta com suas entidades físicas e seus seguidores individuais contra aquelas doenças que são: ignorância, pobreza, conflitos e informação manipulada.
Após o atentado na França, onde morreram mais de cem pessoas, Gülen, inspirador do Movimento Hizmet, escreveu um artigo para o jornal Le Monde. Este artigo chamou a atenção do mundo ocidental e levou algumas críticas do mundo islâmico. O artigo do Gülen foi uma declaração de que o movimento se posiciona contra os grupos radicais, e convida as comunidades muçulmanas a uma autocrítica em vez de sempre culparem aos outros, e a chamar o mundo ocidental ao diálogo. Suas palavras indicam que hoje em dia não há mais fronteiras e temos que aprender a vivermos juntos, respeitando as diferenças dos outros, aproveitando a força da religião para manter a paz mundial.
Por Kamil Ergin