Na corda bamba do apoio popular
Apesar da sua retórica agressiva, dirigida ao próprio eleitorado, Erdogan está de costas contra a parede após o golpe frustrado. Isso foi visto pelo presidente como uma chance de aumentar seus poderes, mas ele sabe que o apoio popular pode acabar da noite para o dia se houver um agravamento da situação econômica. O que é um risco real que já pode ser previsto com a análise das agências de rating, que desaconselham investimento na Turquia, e com o aumento da inflação.
Erdogan subiu na política com um populismo semelhante ao do ex-presidente Lula, com a diferença de que Lula é de esquerda e Erdogan, de direita. Mas o presidente turco conseguiu solidificar sua posição contra os kemalistas (adeptos do secularista Mustafa Kemal Atatürk, pai da República turca) e, mais tarde, contra o movimento de Fethullah Gülen, dando dinheiro e benefícios para as classes mais pobres.
Quem participa de manifestação pró-Erdogan, mesmo na Alemanha, recebe do partido passagens de graça e uma diária. Mas a classe pobre está altamente endividada. Calcula-se que a dívida privada seja hoje de mais de US$ 100 bilhões. Ou seja, 70% dos salários ficam nos bancos. As famílias têm até dez cartões de crédito.
Se a situação econômica piorar, essa camada da população deixará de apoiar o presidente. Do ponto de vista geopolítico, a Turquia, que faz parte do G-20, está em uma encruzilhada. Se a crise (política e econômica) se agravar, os curdos ameaçam com a separação. Já a troca de farpas com a União Europeia é encenação. Erdogan não vai ousar abrir a fronteira para a saída dos refugiados em direção à Europa Ocidental. Sua economia depende da UE para importações e exportações.
As operações de expurgo mostram, porém, que Erdogan está nervoso, tem mania de perseguição. Provavelmente, cumpre seu último mandato. Por motivo de saúde (especula-se que tenha câncer de intestino), não vai mais se candidatar. Mas a Turquia não corre o risco de virar uma nova Síria, nem de uma radicalização islâmica. Devido à sua enorme importância geopolítica, a Otan não deixará que isso aconteça.
Cientista político da Fundação Rosa Luxemburgo, em depoimento a Graça Magalhães-Ruether, Berlim