Autoritarismo não pode ser a resposta
O futuro que vejo na Turquia é muito sombrio. A tentativa de golpe foi vergonhosa e desprezível, e foi um grande alívio que tenha sido evitada. No entanto, a reação de Erdogan é muito decepcionante. Apesar de estar certo em lutar, sua reação agora vai além do combate legítimo a golpistas. Vemos um contragolpe de Erdogan. Seu estilo já era autoritário antes, e agora está indo de mal a pior.
Estima-se 70 mil pessoas dispensadas de cargos públicos sem o devido processo. Muitos dos meus colegas foram trancados na prisão sem uma única prova de que tenham apoiado o golpe. Vários jornais e sites foram fechados. A Anistia Internacional relata que a tortura e o estupro voltaram à Turquia.
O passo mais importante deve ser empoderar o país. Um mal não deve ser trocado por outro. A resposta a uma tentativa de golpe não pode ser o autoritarismo. A liberdade de imprensa já se foi. Agora é quase impossível criticar o governo e o presidente. Os jornais independentes estão profundamente intimidados. A Turquia, por sua resposta à tentativa de golpe, se distancia do mundo democrático. Parece que Erdogan está perdendo uma grande oportunidade de fazer as pazes com a sociedade e construir uma democracia firme, invejada por muitos.
Não acho que o golpe tenha sido encenado pelo presidente, mas acredito que ele sabia que estava chegando e apenas esperou a oportunidade. Ele contribuiu muito para a desestabilização do país. O 15 de Julho pode ser lembrado, anos mais tarde, como o dia em que o regime foi mudado na Turquia.
Erdogan é muito inteligente e astuto, um mestre estrategista. Fará jogo duro com o Ocidente para ganhar pontos em casa, mas com cuidado para não afastá-lo totalmente — porque sabe muito bem que precisa dele financeira, política e militarmente. E todos constatam que a Turquia não cumpre mais as condições para negociar a adesão à União Europeia. Retrocedeu muito na força de sua democracia.
Chefe da sucursal de Bruxelas do “Yarina Bakis”, versão reformada do diário fechado “Zaman”, em depoimento a Breno Salvador