Acordo entre Turquia e União Europeia pode naufragar
Com o contragolpe e a operação geral de expurgo que o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, deu início logo após superar a insurgência dos militares, as negociações entre a Turquia e a União Europeia (UE) praticamente voltaram à estaca zero. Mesmo sem um rompimento oficial, especialistas do governo alemão já começaram a elaborar um plano B a fim de evitar que o fluxo de refugiados para o país volte a ser tão intenso quanto foi no ano passado, caso o país volte a abrir a sua fronteira.
Em 2015, mais de um milhão de refugiados chegaram à Alemanha, mas o fluxo diminuiu dramaticamente com o acordo da UE com a Turquia, fechado no início de abril. Nesta segunda-feira, aliados da chanceler federal alemã, Angela Merkel, e políticos da oposição reagiram indignados a medidas vistas como antidemocráticas adotadas pelo governo turco em reação à tentativa de golpe militar na última sexta-feira.
— A introdução da pena de morte na Turquia significaria para Ancara o fim das negociações de adesão à UE — garantiu Steffen Seibert, porta-voz do governo alemão, durante uma entrevista coletiva, referindo-se à ameaça de Erdogan de reintroduzir a pena capital no país.
No sábado, Merkel, pivô do acordo sobre os refugiados, já havia exortado o presidente turco a respeitar o estado de direito no país. Nesta segunda, as críticas foram ecoadas pelo vice-presidente da União Democrata Cristã (CDU) e governador do rico estado de Hesse, Volker Bouffier, que sempre foi contra o acordo e é também contrário ao ingresso da Turquia no bloco.
— Não se negocia com um país como esse — disse.
A chefe da diplomacia da UE, Federica Mogherini, também advertiu a Turquia de que a sua candidatura à adesão ao bloco europeu poderá ser questionada após as declarações do presidente, no domingo à noite, evocando a possível reintrodução da pena de morte no país.
— Nenhum país pode aderir à UE se introduz a pena de morte — disse.
Com o acordo com a Turquia, negociado principalmente por Merkel, a Alemanha, principal beneficiada, conseguiu superar temporariamente uma crise que quase custou à chanceler o seu governo. Em troca da ajuda de € 6 bilhões, da promessa de isenção da obrigatoriedade de visto de entrada na UE para cidadãos turcos e da aceleração das negociações para o ingresso do país no bloco, foi reduzido drasticamente o número de refugiados que chegam à Europa, provenientes sobretudo de Síria, Iraque e Afeganistão.
PLANO B INCLUI GRÉCIA
Desde então, poucos conseguem cruzar a fronteira com a UE, da Turquia para a Grécia, a fim de seguir caminho em direção à Alemanha — país preferido dos fugitivos por ser mais generoso na ajuda em dinheiro. Mas o pedido de adesão da Turquia ao bloco já havia esbarrado nas crescentes preocupações dos Estados-membros quanto aos excessos autoritários do regime de Erdogan. Ao chegar em Bruxelas, nesta segunda, o comissário europeu para as Adesões, Johannes Hahn, responsável pela candidatura da Turquia, sugeriu que o governo turco já havia preparado, antes mesmo da tentativa de golpe, um lista de pessoas que deveriam ser presas.
— Eu acredito que o fato de que as listas já estavam disponíveis logo após o evento mostra que elas foram preparadas para serem utilizadas em algum momento.
O acordo — que sempre foi polêmico do ponto de vista alemão — tornou-se insustentável depois que, sob o pretexto de punir os culpados, Erdogan começou a perseguir também a oposição.
Agora, o plano B que o governo alemão deve propor, caso o acordo com a Turquia não dê certo, prevê a criação de um lugar central de acolhimento dos refugiados nas ilhas gregas. Refugiados que tiverem o pedido de asilo recusado serão deportados para os países de origem, antes de fazer a longa viagem pela Europa. Em troca de abrigar a central de recepção de imigrantes do bloco, a Grécia, por sua vez, receberia os bilhões que tinham sido prometidos à Turquia.
(*) Correspondente